domingo, 22 de janeiro de 2023

OBISPO MAIS FAMOSO DE MATO GROSSO

 

22 de janeiro

1918 – Dom Aquino assume o governo do Estado




Consequência de amplo acordo entre situação e oposição, depois da Caetanada, que resultou na renúncia do presidente Caetano Manoel de Faria e Albuquerque e na intervenção federal que durou um ano, assume o governo, o bispo de Cuiabá, Dom Francisco de Aquino Correa, no que foi chamado de governo da conciliação.¹

O Matto-Grosso, principal órgão da imprensa no Estado, publicou reportagem completa sobre o dia da posse do novo presidente:



Desde o alvorecer da manhã de 22,apenas se teve aviso da passagem da lancha Iguatemi em S. Antonio do Rio Abaixo, toda a Cuiabá se pôs em preparativos para receber carinhosamente D. Aquino, sabedores como eram todos de que S. Exa. Para aqui se encaminhava a bordo daquela embarcação.



As comissões incumbidas de irem ao encontro do querido eleito do povo mato-grossense puseram-se em ação, e às 9 ½ descia o Cuiabá a lancha 13 de Junho da Secretaria da Agricultura, levando a seu bordo a comissão central encarregada da recepção a D. Aquino, composta dos srs. Capitão tenente Paes de Oliveira, coronéis João Celestino, Gurgel do Amaral, Manoel Moreira, drs. Campos Junior e Geonísio de Mendonça, representantes do interventor federal; D. Antonio Malan por si, e padres Batista Couturon e Colbachini representando a Congregação Salesiana do Estado.

A bordo da “Rosa Bororo” desceu o coronel Alexandre Addor, intendente geral do município, acompanhado de diversos cidadãos da elite cuiabana, dentre eles o capitão Romão da Silva Pereira, representante da guarnição federal desta cidade.

Assim organizada a embaixada que ia ao encontro de D. Aquino, seguiu improvisada flotilha até um pouco abaixo do Poço Grande onde foi encontrada a Iguatemi que sulcava, garbosamente embandeirada as águas barrentas do Cuiabá.

Passando daí em diante a acompanha-la os transportes que tinham ido ao seu encontro, seguiram-na até a usina do sr. Joaquim Martins, onde as diversas comissões daqui enviadas transbordaram para o Iguatemi, apresentando então a D. Aquino as boas-vindas  e votos de felicidade pelo seu governo.,

Prosseguindo os itinerantes em demanda da cidade, aqui desembarcaram por volta de meio dia, sendo D. Aquino alvo das mais estrepitosas palmas ao pisar na terra cuiabana.

Ao desembarcar em companhia do dr. Camilo Soares, que o fora trazer a bordo da Iguatemi, foi saudado pelo cel. Alexandre Magno Addor que em nome do governo municipal apresentou boas vindas à S. Exa.

Do seio do povo dirigiu a palavra ao recém vindo, o sr. Tomé Ribeiro.

O CORTEJO

Depois de recebidos por D. Aquino os cumprimentos de diversos representantes dos partidos políticos do Estado, de congregações religiosas e da imprensa, organizou-se imponente cortejo que respeitosoe vivamente possuído de entusiasmo, acompanhou S.Exa. em demanda da residência oficial.

Ao passar o virtuoso prelado em frente a a igreja de S. Gonçalo, de uma tribuna ali improvisada, saudou-o um inteligente aluno do Liceu Salesiano, sendo logo substituído pelo delegado da sociedade de S. Luiz Gonzaga que apresentou em nome de seus consócios votos auspiciosos de boas vindas a Dom Aquino.

Em sinal de estima para com este futuroso rebento da estirpe cuiabana, discursou também enaltecendo-lhes as virtudes morais e cívicas e augurando dias venturosos no seu governo a gentil senhorita Alda de Oliveira.

Falou por último, abundando nos mesmos conceitos dos oradores que o precederam o sr. João Nunes.

Continuando seu caminho o préstito cívico teve que parar novamente à praça da República para ouvir o ilustre dr. José Mesquita, que ali pronunciou um substancioso discurso, saudando o presidente eleito em nome do povo mato-grossense.

Abafadas pelas mais estrepitosas palmas as últimas palavras do orador, o préstito que cada vez mais se avolumara atravessou por entre duas alas formadas pelas alunas de todas as escolas e colégios públicos e particulares de Cuiabá, tendo D. Aquino feito o trajeto da República até ao palacete de sua nova residência, debaixo de uma verdadeira chuva de flores que lhe arremessava a petizada vivaz de nossas escolas.

NA RESIDÊNCIA PRESIDENCIAL

Chegando D. Aquino Correa no palacete da rua Pedro Celestino onde está residindo, aí saudou-o pela Assembleia Legislativa o sr. desembargador Trigo de Loureiro que em nome da corporação política a que pertence, hipotecou ao governo que se ia iniciar, todo o apoio e colaboração do poder legislativo estadual.

DOM AQUINO FALA AO POVO DE CUIABÁ
Depois de ouvida atentamente a palavra do representante da Assembleia Legislativa, ficou a multidão que concorrera às festas da recepção a D. Aquino, sôfrega por ouvir-lhe a palavra sempre fluente e a frase sempre burilada.

S. Exa. Começou o seu discurso por agradecer nominalmente a todos os que o haviam saudado ao chegar a esta cidade, em nome individual ou por mandato e terminou por agradecer em palavras repassadas de gratidão e sinceridade o carinho com que vinha sendo distinguido.

Na sua bondade em tudo revelada, não esqueceu nem mesmo o concurso prestado pelos selvícolas à sua brilhante recepção.

Perorando acentuou o desprendimento dos partidos políticos do Estado aceitando a sua candidatura à Presidência, para se firmar um regime de paz e de concórdia, e enalteceu a colaboração dos drs. Wenceslau Brás e Camilo Soares, pela vitória desta primeira etapa na política de Mato Grosso.

As últimas palavras de S.Exa. foram acompanhadas dos mais expressivos aplausos, findos os quais dispersou-se a massa popular

O COMPROMISSO DO PRESIDENTE ELEITO E DOS SEUS SUBSTITUTOS LEGAIS

Às 17 horas penetrou no edifício onde funciona a Assembleia Legislativa, que estava reunida em sessão. S.Exa. D. Aquino Correa, que foi ali recebido pelos deputados: drs. Eurindo Neves, Rangel Torres e cel. Pilades Rebuá, que o levaram a tomar assento à esquerda do presidente da Assembleia, o vice em exercício, cel. Faria Albernaz.

Para o fim de prestar o compromisso do cargo de 1° vice-presidente do Estado, compareceu ao passo da Assembleia o dr. Antonio Ferrari, bem como o capitão Paes de Oliveira, para fazê-lo ao de 3°.

Prestado por S.Exa. D. Aquino o compromisso e pelos seus substitutos constitucionais já referidos, ouviu-se demorada salva de palmas, logo que o presidente da Assembleia proclamou empossados os cidadãos compromissados.

Ao se retirar D. Aquino do edifício da Assembleia, fora como acontecera ao penetrar ali, recebido com as continências de estilo, prestadas por uma companhia do 1° Batalhão da Força Pública, comandada pelo cap.Benedito Augusto de Carvalho e pelo esquadrão de cavalaria.

Tanto na ida como em seu regresso teve uma concorrência numerosíssima no seu acompanhamento.

NO PALÁCIO DO GOVERNO

De volta da Assembleia D. Aquino se dirigiu ao palácio do Governo onde foi recebido pelo dr.Camilo Soares e seus auxiliares.

Este, na qualidade de interventor federal, leu perante S. Exa. uma exposição de sua gestão no período em que aqui desempenhou funções governamentais e terminou por apresentar a D. Aquino Correa, votos de felicidade pelo seu governo.

Respondendo S. Exa. às palavras do dr. Camilo Soares, disse que o seu programa de governo podia se reduzir a esta trilogia: paz, economia e trabalho..

Referindo-se à primeira das facetas do plano traçado, disse, precisamos ter uma paz generalizada e completa, isto é, mantê-la entre o Estado e os poderes centrais da República+, cultivá-la entre si os poderes constituídos do Estado, e procurarem-na de modo eficiente os partidos políticos, conservando-se mesmo cada um em seu posto e independente de fusão.

S. Exa. encareceu depois as conveniências de rigorosa economia em seu governo para o que disse muito contar com o poder legislativo, e, por último apelou para todas as forças vitais do Estado, para, sob os auspícios da concórdia, da economia e do trabalho promovermos o progresso e o engrandecimento de Mato Grosso.

Retirando-se S. Exa.do palácio do Governo, sendo-lhe prestadas as continências da pragmática, dirigiu-se à sua residência acompanhado de crescido número de autoridades e amigos.²
 


FONTE: ¹Rubens de Mendonça, História do Poder Legislativo de Mato Grosso (volume I), Assembleia Legislativa, Cuiabá, 1967, Página 111. ²O Matto-Grosso, (Cuiabá) 24 de janeiro de 1918.





 
 

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

GUERRA DO PARAGUAI

 

12 de janeiro

1865 - Exército paraguaio ocupa Miranda abandonada

 

 

 

As colunas de Martin Urbieta e de Francisco Resquin (foto), responsáveis pela invasão do Brasil, por terra, agora juntas, sob o comando de Resquin, ocupam a vila abandonada de Miranda.

A tática da ocupação e as condições do povoado são detalhadas pelo comandante em parte aos seus superiores em Assunção:


Viva a República do Paraguai!


Sr. Ministro. Como tive a honra de comunicar à V. Exª em minha última parte, empreendi minha marcha a curtas jornadas  chegando a esta vila em 7 dias e meio de Nioaque.

No dia 12 fiz alto no riacho Vilasboas, uma légua da vila de Miranda, de onde despachei um esquadrão ao mando do capitão cidadão Romualdo Canteros, com o fim de explorar a disposição  da vila, e com ordem de dar-me parte se a encontrasse com tropas em atitude de defesa, ou de ocupa-la em caso contrário segundo anunciavam pombeiros.


O resultado da exploração foi encontrar-se a vila abandonada.

Em vista disso mandei ocupar a dita vila, com a vanguarda composta de dois esquadrões e uma companhia de infantaria ao mando do 2° comandante capitão cidadão Bras Rojas, com ordem de apoderar-se do parque e de todo armamento que encontrasse, assim como dos barcos que houvessem no porto, lavrando-se o inventário correspondente com o capitão cidadão Martin Urbieta.


Na vila abandonada se acharam dois italianos chamados Juan Balvita e Fernando Tabaldi e um negro brasileiro chamado José Ribeiro.


Pelo primeiro sabe que o chefe brasileiro tenente-coronel Dias da Silva depois de haver pretendido descer em canoa o rio Mondego com destino a Cuiabá, havia regressado  com a notícia de que nossas forças se haviam apoderado dos pontos do litoral do Paraguai até Corumbá, por cujo motivo seguiu sua fuga por terra com dez ou dez oficiais para o Taboco lugar de estância que se acha à costa do rio Aquidauana, mas que segundo outros dados se propunha a descer pelo rio Vacaria ou Brilhante, Ivinhema ou Igareí e dali pelo Paraná a província de S. Paulo, subindo pelo rio Tietê.


O próprio chefe brasileiro Dias da Silva em sua fuga vergonhosa tinha vindo aterrando as famílias desde Nioaque com a mentira de que a coluna paraguaia vinha degolando a quantas pessoas achava sobre sua marcha.


Isto explica o fato de achar-se todas as casas desertas, fugindo seus donos para os montes.


Em contraposição de tanta falsidade me é grato dizer a V.Exª  que alcançada em sua fuga a família do brasileiro Antonio Cândido de Oliveira com três carros de equipagem e dez vaqueiros, longe de ter sido danificada em coisa alguma, tem sido atendida e volta para sua casa.


Segundo informação do mencionado Barbosa, todas as famílias da vila logo que receberam aquela falsa notícia, depois da chegada do tenente-coronel Dias da Silva que deixou acreditada sua covardia na jornada do Arroio Feio abandonaram suas casas dirigindo-se umas à Salobras outras ao outro lado do rio Aquidauana, e que os índios, aproveitando a ocasião haviam-se lançado sobre as casas abandonadas saqueando-as até a hora da nossa chegada a esse ponto, causando infinitos prejuízos, inclusive o mesmo parque ou depósito de armamento e munições do quartel, d’onde segundo dizem uniformemente os três indivíduos acima ditos, que ficaram na povoação, haviam levado cada índio até duas armas de fogo com pólvora e completas, deixando unicamente o que não podiam levar.

A tudo isto deu lugar o abandono que desta povoação fez o sargento-mór Caetano de Albuquerque que comandava o batalhão de infantaria que guarnecia a vila, havendo-se dispersado todos sem se saber o destino que este chefe havia tomado.


Ficam em nosso poder quatro canhões com seus carros de munições, quinhentos fuzis, 67 clavinas, 131 pistolas, 468 espadas de tropa, 1000 lanças, 9817 projetis de artilharia de diferentes calibres a saber: 1278  obuses, 5524 balas rasas, 1956 pirâmides, 1070 botes de metralhas que com os outros artigos que consta da relação junta compõem o resto do parque despojado.


Levo também às mãos de V. Exª o inventário dos haveres da igreja, que segundo me informa o capelão cidadão Francisco S. Espinosa também foi saqueada como os demais, como bem se notava pelos ornamentos acessórios.


A povoação da vila, fora a igreja, casa do comandante e o quadro do quartel contíguo, consta de 84 casas, 41 de telhas e 43 de palha em uma situação como a 3 cordas do rio Mondego é terreno fragoso de macegas e montes, sem vista alguma pelos lados, com águas meio salobras,  qualidade de que participa o mesmo rio.


No porto encontrou duas chalanas, uma servível debaixo d’água e outra deteriorada que pode compor-se, além de um lanchão novo pronto a receber estopa, como desde logo o fiz concluir por haver posto à minha disposição seu dono o mesmo italiano Balbita, e poderá servir para transporte dos armamentos e munições encontrados, sem nenhuma pólvora.

Os canhões se achavam carregados com metralha que mandei descarregar.


O capitão Urbieta que sobre sua marcha para esta vila a 9 do corrente (janeiro) se incorporou com a coluna do meu comando, acha-se ao comando desta vila.


No arquivo não encontrei mais que pedaços de papeis inúteis.

Os índios se acham também dispersos pelos montes e me consta que as 5 aldeias que se encontram sobre o caminho do Nioaque se acham desertas.


Na Estância imperial que se acha a outro lado do Mondego coloquei uma guarda ao mando do alferes cidadão Inácio Cabrera, afim de impedir aos índios o despojo da dita estância, como já começam a fazer, pegando os animais mais mansos pelas picadas que haviam praticado pelos montes.


O piquete que guardava a porta desta vila ao porto ao mando do sargento Ramon Torres, sofreu o desgraçado incidente de que as 9 da noite do dia 12, caindo em terra uma vela acesa ardeu completamente a peça que havia estado semeada de pólvora e pedaços de papel, ofendendo ao sargento e quatro soldados. Isto sucedia quando por uma forte chuva se refugiava na dita casa o piquete mencionado. Os feridos d’este acidente ficam em cura.


Deus guarde a V.Exª muitos anos.


Vila de Miranda, 14 de janeiro de 1865


Francisco y Resquin.¹



Somente no dia 31 de janeiro, o comandante brasileiro, tenente-coronel Dias da Silva, a caminho de  Santana do Paranaíba, libera relatório onde explica as razões de sua fuga:

...e constando-me que o inimigo se achava já a poucas léguas de marcha para a vila. De modo a não dar lugar a delonga alguma, retirei-me com a pequena força do Batalhão de Caçadores, mandando antes ordem para a Salobra (...) para de lá seguir o corpo e algumas praças com direção à estrada da fazenda do Daboco (aliás Taboco) a encontrar-se comigo. Sendo forçado a abandonar os arquivos e bagagens dos corpos por falta absoluta de condução para tudo; o que tem ocasionado a maior penúria e toda sorte de privações por se haver retirado toda a força com a roupa do corpo e a maior parte dos oficiais a pé com suas famílias.

 
Mais adiante, o oficial brasileiro lastima a ação impetuosa do inimigo e o estado geral da tropa sob seu comando:

A força que tomou a colônia de Miranda vem arrasando essa parte da fronteira até a vila do mesmo nome, e a que tomou a dos Dourados seguiu pela Serra de Maracaju, vindo pelo Brilhante até ao Taquaruçu com o mesmo sistema de delapidação. No estado de nudez e miséria em que se acha a pequena força que comigo se retira, sigo até a vila da Santana do Paranaíba a fim de esperar ali as determinações de V.Exa. a quem com toda insistência solicito alguns recursos pecuniários e de fardamento que me habilitem a mover-me com presteza para onde V. Exa. entender conveniente.²


FONTE: ¹
Boletim A Imprensa de Cuiabá, 18 de maio de 1865. ²Jorge Maia, A invasão de Mato Grosso, Biblioteca do Exército Editora, Rio, 1964, página 204.




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segunda-feira, 15 de novembro de 2021

15 de novembro

 15 de novembro

1889 - Rondon participa da proclamação da República



Positivista convicto e ativista do movimento contra a Monarquia, o alferes matogrossense Cândido Mariano da Silva Rondon, participa no Rio, da proclamação da República, cujo apoio ele relata em seu diário:

Estava cheio o quartel. Chegamos na ocasião em que era arrombada a Arrecadação. Pedi logo um dos revólveres nagan que estavam sendo distribuídos – arma que conservo, com a que me ofereceu Roosevelt, verdadeiras peças de museu.


Benjamim Constant chegou às 2 da madrugada. Conferenciavam os oficiais, entre os quais o Cel. Sólon. Ficou resolvido que se indagasse se a Marinha permitiria a saída da ‘Brigada Estratégica’ e foi, nesse sentido, redigido um ofício ao Alte. Wandenkolk.


Escolheu Benjamin Constant para portadores de tão importante mensagem os dois discípulos em quem mais confiava – os discípulos amados – Fragoso e eu. Seríamos a ligação entre a ‘Brigada Estratégica’ rebelada e os oficiais revoltados da Armada.


As 4 horas partimos em cavalos escolhidos para uma galopada de São Cristóvão ao Clube, no largo do Rossio.


O tropel dos cavalos cortava o silêncio da madrugada, mas prosseguíamos sem obstáculos. Cauteloso, propus, aos sairmos da rua Gen. Pedra para defrontar o Quartel General, que nos mantivéssemos cosidos com a grade do jardim, para não sermos percebidos.


Estava o Quartel General todo iluminado, como que para advertir que o governo vigiava.


Continuamos a cautelosa marcha, quase que sopitando o pisar dos cavalos, para que não ressoasse na calçada, até desembocar na Câmara Municipal.
Ao fazer a curva para ganhar a rua da Constituição o meu cavalo prancheou – mas o vaqueiro mimoseano galopava firme na rédea e o animal que rodara, conseguiu firmar-se.


Seguíamos insensíveis a tudo o que não fosse o pensamento de chegar o mais depressa possível ao largo do Rossio, ao Clube Naval e, quando apeamos estavam nossos cavalos brancos de espuma.


Levávamos a senha. Batemos, uma portinha que nos fora indicada, três pancadas espaçadas. Depois de alguns minutos percebemos que alguém descia. Ouvimos, de dentro, as palavras da senha a que respondemos, repetindo por três vezes a contra-senha, segundo as instruções recebidas. Abriu-se então uma fenda na portinha, por onde introduzimos o ofício. Daí a pouco voltou quem recebera de nós o documento e, repetidas as mesmas formalidades, foi-nos entregue pela fenda o ofício resposta.

O tempo de montar de novo e lá partimos para o convento de Sto. Antonio, onde estava aquartelado o 7º Batalhão de Infantaria, a fim de informar a situação o cap. Ferraz. Já encontramos todos a postos. Depois de lhe falar e de lhe transmitir a mensagem de que éramos portadores, tocamos para São Cristóvão a galope, sem acidente.

O dia despertava. Súbito, tingiu-se o oriente sob uma chuva de ouro, pálida a princípio e depois cada vez mais rubra... e sobre essa cortina surgiria em breve o sol a iluminar um novo dia, a iluminar pela primeira vez a República brasileira.


FONTEEsther de Viveiros, Rondon conta sua vidaCooperativa Cultural dos Esperantistas, Rio, 1969, página 53.

quarta-feira, 1 de setembro de 2021

11 de dezembro

11 de dezembro 

1865 -Taunay chega ao Taquari 

A frente das tropas, a comissão de engenharia da força expedicionária alcança o rio Taquari:

"Percorremos uma outra légua a rumo O e atingimos a margem esquerda do majestoso Taquari, depois de 5 1/2 léguas de viagem, caminhando, ora entre cerrados, ora entre capoeiras de difícil trânsito. O Taquari. formado pelos rios Pântano e São José de um lado, Ariranha e /taquari propriamente dito do outro, (os quais têm as suas cabeceiras em uma zona de sete léguas, mais ou menos), apresenta já aí considerá vel massa de água; largura de 72 metros e profundidade variável; oferecendo mais adiante do porto nado em toda sua extensão, mesmo nas maiores secas.

A sua correnteza é extraordinária na cachoeira que aí se forma, modificada no remanso, onde tem apenas a velocidade de 1,10 a 1,30 por segundo: o leito é de areia e em alguns lugares de rocha; corre na direção S.S.O. A passagem é feita por meio de uma canoa que os viajantes terão muitas vezes que ir buscar a nado na margem oposta, pois que não se encontram barqueiros". 

FONTE: Taunay, Em Mato Grosso Invadido, Edições Melhoramentos, S. Paulo, sd., página 99.


11 de dezembro

1924 - Estado arrenda minas de manganês em Corumbá

Realizada concorrência pública para arrendamento das minas de manganês situadas no município de Corumbá, tendo sido aceita a proposta da Empresa de Mineração, que assinou o respectivo contrato a 18 do mesmo mês.

Para o presidente Estevão Alves Correa, que firmou o contrato, a iniciativa abre "nova fase de esperanças de próximo início do aproveitamento das opulentas jazidas de minérios do Urucum, cuja produção industrial, inaugurada a 6 do corrente, contribuirá, sem dúvida, para o progresso local e do Estado".


FONTE: Mensagem à Assembleia Legislativa de Mato Grosso, em 13 de maio de 1925,página 50.



11 de dezembro

1953 - Criados os municípios de Sidrolândia e Água Clara

O governador Fernando Correa da Costa, sancionou lei, criando mais dois municípios no Sul do Estado: Sidrolândia, desmembrada de Campo Grande e Água Clara, de Três Lagoas.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

14 de outubro

14 de outubro

Inaugurada a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil


Primeira estação ferroviária de Campo Grande

Tida como uma das datas mais importantes da história de Mato Grosso, no que toca ao seu desenvolvimento econômico, sobretudo nA região que em 1977 passaria a constituir o território de Mato Grosso do Sul, é, oficialmente entregue em  14 de outubro de  1914,  a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, cujos trilhos foram ligados a 31 de agosto, completando a obra, com o encontro das duas frentes de trabalho, de Itapura e Porto Esperança. 

O trem inaugural chegou a Campo Grande por volta das 10 horas:

A fim de recepcionar a comitiva oficial que precedia à solenidade inaugural, o intendente municipal, sr. José Santiago, foi a Rio Pardo, acompanhado dos srs. dr. Silva Coelho, juiz de direito, José Paes de Faria, Pedro Romualdo e Miguel Garcia. Aquela ilustre comitiva compunha-se do dr. Carlos Euler, representante do sr. ministro da Viação, coronel José Beviláqua, representando o ministro da Guerra, senador Antônio Azeredo, general Caetano Albuquerque, deputado A. de Mavignier, drs. Firmo Dutra, Emílio Amarante, Hilário Adrião e os jornalistas C.S. Rutlindg do Times, Dário de Mendonça do Jornal do Comércio, do Rio, Macedo Soares de O Imparcial e Sílvio Cardoso, de a Época, além de outras pessoas gradas e convidados.


A Câmara municipal, reunida em sessão solene, recepcionou os visitantes, sendo os representantes do governo saudados pelo juiz de direito dr. Manoel Pereira da Silva Coelho. O senador Antônio Azeredo agradeceu em nome do governo e dos visitantes.

A ferrovia foi desativada em 10 de junho de 2015.


FONTEJ. Barbosa Rodrigues, História de Campo Grande, Edição do autor, Campo Grande, 1980, página 129

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

30 de janeiro


30 de janeiro

1827 – Langsdorff chega a Cuiabá


Aporta, finalmente na capital da província a expedição científica, chefiada pelo barão Jorge Henrique de Langsdorff, cônsul da Rússia no Rio de Janeiro, incumbida de efetuar exploração em Mato Grosso e Amazônia, patrocinada pelo czar Alexandre I.

A chegada da missão a Cuiabá é descrita pelo desenhista Hercules Florence em suas anotações de viagem:

Enfim a 30 de janeiro de 1827, atingimos o porto tão desejado de Cuiabá. Aproamos ao troar das salvas de mosquetaria que partiam de entre os nossos e eram correspondidas de terra. O guarda da alfândega levou-nos para o seu escritório, enquanto esperávamos os animais que deviam evar-nos até à cidade, distante um quarto de légua.Os Srs. Riedel e Taunay tiveram a bondade de mandá-los com prontidão, avisando que viriam receber-nos. Com efeito não tardaram a chegar em companhia de várias pessoas da localidade e de um negociante italiano chamado Angelini.

Fomos imediatamente ter com o presidente e dele tivemos mais cortês e amável tratamento durante os oito ou dez dias que nos reteve em seu palácio como hóspedes.

Florence aproveita a estada na capital da província para mostrar o que viu na cidade:

A cidade de Cuiabá é cercada de colinas que com ex­ceção da parte ocidental limitam-lhe o horizonte. O plano em que assenta é inclinado até à base dos outeiros do lado meridional, onde corre um riacho chamado Prainha que em direção quase reta vai para oeste e, separando a cidade de um de seus arrabaldes, atravessa uma planície de quarto de légua, com curso paralelo ao caminho do porto, até cair no rio Cuiabá. No tempo seco fica todo cortado e chega a desaparecer.

As ruas que de este vão para oeste têm pequeno declive de subida e descida, mas as que lhe são perpendiculares, de sul a norte, o têm mais sensível, bem que em geral suave. Ao sair da cidade para o lado norte, eleva-se o terreno ainda por espaço de 300 a 400 passos, formando um campo chamado de Boa Morte, por aí existir uma igreja desse nome.A cidade pode ter meio quarto de légua de poente a nascente e dois terços dessa distância de norte a sul. Não há senão 18 ou 20 casas de sobrado, esse mesmo pequeno: todas as mais são térreas. Cada casa tem nos fundos um jardim plantado de laranjeiras, limoeiros, goiabeiras, cajueiros e tamarindeiros, árvore cuja folhagem densa e escura
forma no meio das outras agradável contraste, concorrendo todas elas para darem à povoação aspecto risonho e pitoresco.

Rebocam-se por fora as habitações com tabatinga, que lhes dá extrema alvura: entretanto muitas há, principalmente nos arredores, que conservam a cor sombria da taipa de que são feitas, bem como todos os muros e cercados. Não há uma só casa que tenha chaminé: a cozinha faz-se no jardim debaixo de um telheiro.

O edifício em que estão o presidente e a intendência chama-se palácio: é térreo; as janelas, únicas na cidade, têm caixilhos com vidros. Há uma cadeia, em cujo sobrado trabalha a câmara municipal; um quartel para a tropa, uma casa da moeda e quatro igrejas: a de Bom Jesus que é a catedral, sem nada exteriormente que a recomende, a de Nossa Senhora do Bom Despacho, a de Nosso Senhor dos Passos, e a da Boa Morte, além de uma capela consagrada a Nossa Senhora do Rosário. Outra capela fica no Hospital da Misericórdia, edifício não concluído e onde mora o bispo. Para os morféticos há uma casa, situada a meia légua sul da cidade. A meio quarto este vê-se perto do porto uma grande
construção que havia sido começada para quartel. Por enquanto não é senão
um corpo de guarda.

Na casa da moeda bate-se somente o cobre que é mandado do Rio de Janeiro e ao qual se dá valor duplo do que tem no resto do Império. Há também uma fundição para pôr em barras o ouro. O único passeio que tem a cidade é o caminho de meio quarto de légua de extensão que vai ter ao porto. Aí só se vêem 15 ou 20 casas, algumas canoas, guanás, caburés, negros e mulatos.
Quando chove, as crianças entretêm-se em procurar ouro no meio das ruas, porque nos regos d’água que se formam descobrem sempre algumas palhetas. Por toda a parte anda-se aqui por cima dele; nas ruas, nas casas que não são ladrilhadas, nos jardins, não há polegada de terra que deixe de o conter. O pescador na sua choupana pisa o precioso metal; metade de um dia, porém, de trabalho em buscar arrancá-lo do solo lhe traz menos vantagem que a pesca de um único pacu. É contudo o objeto de extração que os habitantes conseguem. 

Os diamantes se acham no Quilombo, distante 14 léguas e daí a 30 no distrito Diamantino. Estes dois artigos, ouro e diamantes, constituem a riqueza da província; nada mais se exporta a não ser diminuta porção de açúcar e de tecidos de algodão, com destino ao Pará.

Não tratam da agricultura nem da criação de animais senão para Não tratam da agricultura nem da criação de animais senão para acudir às necessidades da alimentação. Por toda a parte cercados de desertos, dos quais o menos vasto tem 100 léguas de largo, não poderiam os cultivadores exportar o sobressalente de suas colheitas ou os resultados de sua indústria sem gastos que elevariam o preço dos produtos de medo a não suportarem a mais ligeira concorrência. As produções do país são a cana, da qual se extrai o melhor açúcar do Império; o fumo que é excelente; o algodão, o café, feijão, milho, mandioca e tamarindo que aí se acha mais abundante que em qualquer outra parte e do qual se fazuma massa para exportação.

Limita-se a indústria à exploração de minas e ao fabrico de peças de algodão grosso de que se veste a gente pobre. Faz-se aguardente de cana de superior qualidade. É a principal bebida do país, bem que esteja também em uso o vinho, cuja procura é limitada em razão do alto preço. Cada garrafa custa com efeito de 1$200 a 1$800, o que faz com que sejam motivos de luxo e ostentação franqueá-las aos convivas por ocasião de festas de casamento
ou batizados. Assisti às bodas de um homem apatacado, nas quais se beberam
200 garrafas de vinho, o que representa uma despesa de mais de 200$000
(1.250 francos). Quase igual quantidade consumiu-se num batizado. Os
casos de embriaguez não são raros. 

Cria-se muito gado vacum que por toda a parte encontra excelentes pastos; também a carne de vaca em Cuiabá é suculenta; há muitos porcos cuja banha serve para o preparo da comida; galinhas em abundância e tão baratas que por 400 réis (50 soldos) pode-se as ter à mesa do almoço, jantar e ceia; carneiros e cabras, estes em menor quantidade, etc. Não há falta de cavalos; a qualidade, porém, é inferior. Parte deles vem dos guaicurus. As bestas são mandadas
de São Paulo. Em viagem, é de uso servirem os bois mansos de animal de carga.

Não se acha ouro em porção que dê algum lucro, senão nos arredores da cidade ou a algumas léguas de distância. Se, porém, se empregassem os meios de que usa a companhia inglesa em Minas Gerais, cavar-se-ia melhor a terra, achando-se ainda tesouros imensos. Hoje o dia de trabalho de um preto não rende mais de 300 a 400 réis, salvo o caso de algum achado feliz.

Cuiabá deve sua fundação à grande quantidade de ouro que deu o terreno em que assenta, cujas escavações e buracos atestam hoje quanto foi revolvido. Nos primeiros tempos dos descobrimentos dos paulistas encontraram-se folhetas que pesavam até uma arroba, único incentivo que chamou uns sertanistas ávidos de riquezas e os impeliu em solidões desconhecidas, levando tão-somente espingardas, pólvora, bala e sal. Embarcaram em Porto Feliz e seguiram a rede de rios que lhes pôde proporcionar dilatadíssima viagem. Chegados ao ponto onde hoje é Cuiabá, a um caçador depararam-se grandes pedaços de ouro no alto da colina em que se ergue presentemente a igreja de Nossa Senhora do Rosário. Parou então a caravana. Meteram as canoas no ribeirão Prainha, que nesse tempo era navegável e hoje não por terem sido desviadas as águas, levaram quanto puderam do encantado tesouro e voltaram
para São Paulo, contando maravilhas.

Reuniram-se logo multidões de aventureiros que formaram novas expedições, ficando muitos deles no país novamente descoberto em companhia das mulheres indígenas que encontravam ou das que haviam levado consigo. O número foi crescendo e com ele aparecendo dissensões e lutas causadas pela avidez em tirar ouro. Então cuidaram de constituir uma espécie de governo e para legalizá-lo mandaram pedir chefe em São Paulo. A colônia, debaixo do nome de Cuiabá, nome dos índios que aí habitavam, fez rápidos progressos, aumentando continuadamente com a chegada de novas bandeiras, que, não se satisfazendo mais com o que encontravam, seguiram para diante e foram descobrir, a 100 léguas para O., Mato Grosso, donde provém a denominação de toda a província. Aqueles intrépidos sertanistas teriam sem dúvida ido até ao oceano Pacífico, se os espanhóis não ocupassem as costas. Suas ousadas explorações chegaram com efeito a dar cuidados à corte de Madri que se queixou à de Lisboa, mandando reclamações a tal respeito.

O modo de extrair ouro é o seguinte: fazem-se grandes escavações e transporta-se a terra, à medida que se a vai tirando, para uma área preparada à beira de um rio, córrego ou lagoa em paralelogramo de terra batida e conseguintemente dura, cujos lados são fechados por tábuas, exceto o que encosta à água. O plano é inclinado e o todo se chama uma canoa. Deposita-se a terra que se quer lavar na parte superior e sobre ela lança trabalhador de contínuo água para que facilmente corra a porção que for mais destacada e leve. Em seguida, depois de repetida esta operação, põe ele certa quantidade na beira de uma espécie de alguidar de pau chamado bateia e com um pouco d’água imprime ao todo um movimento circular, de modo que de cada vez o monte de terra seja lambido pela água. Se houver ouro, as menores partículas depositam-se logo no fundo.

Costumes dos Habitantes de Cuiabá

Descrever os costumes gerais da população de Cuiabá, é decerto descrever os de todos os brasileiros; entretanto aqui várias circunstâncias locais concorreram para dar hábitos peculiares à terra, imprimindo-lhes cunho característico e, embora pernicioso, de certo modo original.

A população não passa de 6.000 habitantes, a de toda a província de 30.000, sem contar os índios mansos e muito menos os bravios. Entretanto pelo conhecimento mais ou menos exato dos aldeamentos de uns e hordas dos outros, creio que seu número não chegará a 6 ou 7 mil almas, de modo que numa zona muito maior que toda a França não há mais de 37.000 habitantes.
Tão pouca população provém de que não há 125 anos que Cuiabá foi descoberta e todos quantos procuraram estas terras atraídos só pela posse do ouro, uma vez conseguido esse fim, trataram de se ir embora para gozarem das riquezas ganhas em país mais civilizado. Os que se deixavam ficar, ricos em pouco tempo e no meio de solidões, só cuidaram em satisfazer os sentidos. Entregaram-se a grosseiros prazeres e viveram com amásias, não se lhes dando de formar famílias e educar os filhos, quando os tinham, nos sãos princípios da religião e da moral. As mesmas causas ainda hoje persistem em Cuiabá, embora se manifeste salutar tendência para a modificação. Os casamentos ainda são
pouco freqüentes. Geralmente só se casam os homens já maduros que buscam
uma companheira para os tempos da velhice. Os mais vivem amancebados e nem se limitam a isso, entretendo intrigas amorosas com pessoas casadas e solteiras.

As mulheres de classe média e sobretudo inferior, são muito livres nas suas conversas, modos e costumes. Além do contínuo exemplo da licença geral e quase desculpada, recebem pernicioso influxo do contato dos escravos, negros
e negras, cujas paixões violentas não vêem peias à sua expansão. A fidelidade conjugal é, muitas vezes, falseada. Apesar de temerem os maridos e considerá-los como amos e senhores, sabem perfeitamente enganá-los. Não faz muito que elas começam a aparecer à mesa de jantar ao lado dos parentes e maridos. Entretanto em todas as casas do sertão, onde recebi hospitalidade, nenhuma delas se apresentou, ficando sempre no fundo dos aposentos, a menos que não seja a pessoa já muito familiar. Conheci, contudo, uma senhora muito bem falante, civilizada e espirituosa. Três outras nas mesmas condições tinham, porém, já sua idade e, apesar do muito que haviam dado que falar em sua mocidade, passavam por tipos de virtude.

As moças filhas de pais pobres nem sequer pensam em casamento. Não lhes passa pela cabeça a possibilidade de arranjarem marido sem o engodo do dote e, como ignoram os meios de uma mulher poder viver de trabalho honesto
e perseverante, são facilmente arrastadas à vida licenciosa, na qual, justiça se lhes faça, apesar de pertencerem a todos, nunca mostram a ganância e as baixezas das mulheres públicas da Europa.

Quem exercita em Cuiabá ofícios e artes são quase todos mulatos. Conheci um padre de cor parda, muito eloquente no púlpito e na conversação; outro, quase negro, era um desses raros talentos modestos, cuja ambição única é instruir-se.

O clima da cidade é muito quente, sua latitude 15°36’S. O rio é farto de pescado, sobretudo de junho até fins de dezembro. Então é o alimento principal do povo. Pescam- se muitos pacus, dourados, piracanjubas, piaus, piracachiaras, jiripocas, palmitos, cabeçudos, corimbatás, peixe-rei, etc. É tanto o peixe que os bois, cavalos e pretos ou guanás vão curvados ao seu peso vendê-los pela cidade. De todos é o pacu o mais gordo e mais abundante, bem que não seja o mais delicado; sabe, contudo, bem ao paladar e a quantidade é tal que fornece a combustível com que se iluminam todas as casas. Acontece
até que os pescadores atiram fora grandes montes, quando não querem nem mesmo dar-se ao trabalho de extraírem o azeite.

FONTE: Hercules Florence, Viagem fluvial do Tietê ao Amazonas, de 1825 a 1829, Edições Melhoramentos, São Paulo, 1941, página 

FOTO: Desenho de Hercules Florence, integrante da Expedição Langsdorff.



30 janeiro



1905 – Decretado o primeiro Código de Posturas de Campo Grande 

Avenida Calógeras no início do século passado
É sancionado pelo intendente geral Manuel Inácio de Souza (Manuel Taveira) e entra em vigor, o primeiro código de postura de Campo Grande, composto de 54 artigos e 12 capítulos que tratavam de economia e asseio dos açougues, instalação de curtumes, regras para a limpeza pública, vacina obrigatória de todas as pessoas que viviam na vila, administração dos cemitérios e regras para o enterro dos falecidos, venda de gêneros alimentícios e mercadorias, punições a quem alterasse ou falsificasse produtos, a quem vendesse por pesos, medidas ou balanças não aferidos, aforamento de terrenos municipais e edificações de prédios e reparos, trânsito e conservação de estradas e regras de relacionamento social.

O código de postura reordenava as relações sócio-econômicas, adotava medidas de saúde pública e outras medidas que atendiam também ao interesse do governo federal, que em 1907, reformulou o contrato de arrendamento com a Companhia de Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que estabelecia a alteração da rota da ferrovia para Corumbá.

FONTE: Alisolete Antonia dos Santos Weingartner, Campo Grande, da emancipação política à atualidade, in Série Campo Grande, Ano I 1999, Funcesp/Arca, Campo Grande, 1999, página 15



30 de janeiro


1906 – Oposição vence em Mato Grosso


Totó Paes perdeu a eleição e a vida

Realizam-se eleições para renovação das bancadas de Mato Grosso no Congresso Nacional. A oposição, liderada por Generoso Ponce, o chefe da Coligação, vence apesar da repressão imposta pelo governo de seu arquiinimigo Totó Paes. Antônio Azeredo é reeleito para o Senado e elegem-se deputados federais Serzedelo Correa, Joaquim Augusto da Costa Marques e Benedito Crispiniano de Sousa.

FONTE: Lécio Gomes de Souza, História de Corumbá, edição do autor, Corumbá sd. Página 93.



30 de janeiro

1919 - Gripe espanhola em Cuiabá


Santa Casa de  Misericórdia de Cuiabá

A gripe espanhola que avassalou a Europa e capitais litorâneas do Brasil, chega a Cuiabá e passa sem causar estragos de pandemia, mas deixando um rastro de tragédia, conforme dados publicados pelo jornal governista, o Matto-Grosso, que tenta minimizar a situação:

É que os germes da infecção haviam, sem dúvida, aportado à nossa capital enfraquecidos na sua virulência, pela maior demora na viagem e pela desinfecção rigorosa que as embarcações sofriam no Posto do Amolar.

De 15 a 30 de dezembro chegaram algumas outras lanchas de Corumbá e trouxeram novo contingente do vírus, a reforçar a quota do que havia. Então, estalaram muitos outros casos, de sorte que o ano findou, entre nós, oferecendo a epidemia o seu maior paroxismo. Podem calcular -se em 2 a 3 mil casos, os que se contaram até 31 de dezembro. Nos quarteis do 39° e 
da Força Pública cairam doentes quase todos os soldados e muitos oficiais. No hospital da Santa Casa internaram-se algumas dezenas de enfermos. Várias famílias foram atacadas em seu domicílio. Mas foi tudo - e ainda assim com uma benignidade muito confortadora: onze óbitos apenas nos en
lutaram em todo o mês de dezembro, correndo por conta da chamada gripe epidêmica.

Cabe salientar agora o papel representado nesta quadra angustiosa pelos postos de socorros, criados durante este mês e funcionando ativamente, a fornecer medicamentos e víveres a todos que deles precisavam, minorando extraordinariamente a situação difícil da pobreza.

É de justiça salientar o nome dos dois sacerdotes beneméritos que nesses postos tão humanitários serviços prestaram: padre Manoel G. de Oliveira e frei Ambrósio Daydée.

Na primeira quinzena de janeiro, estabeleceu-se o período de estado da epidemia, mantendo-se ela com a média de um óbito por dia. Depois entrou o mal em franco declínio e agora, ao terminar o mês, são rarissimos casos novos aparecidos e nenhum falecimento por essa causa se tem mais verificado.

FONTE: jornal O Matto-Grosso (Cuiabá), 30 de janeiro de 1919.


30 de janeiro

1934 - Paranaíba é contra separatismo e defende plebiscito para divisão do Estado



Prefeito Francisco Faustino Dias
Com o movimento divisionista em plena efervescência em todo o Sul do Estado, o município de Paranaíba, por meio de suas principais autoridades constituídas, decide-se contra a separação. A posição foi formalmente definida em longo manifesto endereçado ao interventor federal em Cuiabá, Leônidas de Matos:

Como legítimos interpretes do sentir e das aspirações do povo do histórico município de Santana do Paranaíba, a sentinela avançada do nosso grandioso Estado de Mato Grosso, nas fronteiras do estados irmãos de Goiás, Minas e S. Paulo; com as responsabilidades históricas que lhe decorrem, como município e cidade primaz desta unidade do "hinterlande" brasileiro, diante da campanha impatriótica, inoportuna e improcedente, separatista iniciada na cidade de Campo Grande, por pessoas às quais faltam credenciais para falar à Nação, em nome do povo matogrossense, pois dele, em sua maioria, não são filhos, nem a ele prestaram serviços que lhes outorgassem tamanho direito, vimos, pela presente representação, trazer à Vs. Exas., lídimos e legítimos representantes do nosso querido Estado, a manifestação espontânea e sincera e entusiástica de nossa solidariedade no repúdio a tão nefasta tentativa.

Não reconhecemos motivos imperiosos de ordem histórica, social, econômica ou geográfica que traduzam o imperativo de se parcelar ou mutilar a integridade do território matogrossense, destruindo a sua unidade política no concerto do demais Estado que formam a federação brasileira. Seria trair e desonrar o inestimável legado dos nossos maiores.

Inestimável reserva econômica do nosso país, pelas suas incalculáveis riquezas naturais, pela sua riquíssima rede potamográfica, pela uberdade de suas terras feracissimas, pelo crescente desenvolvimento de suas indústrias, principalmente a pecuária, o mate e a cultura da cana de açucar, Mato Grosso será, em futuro não muito remoto, pelo trabalho construtivo de seus filhos e dos irmãos de outros estados, que lhe trazem o seu concurso, um dos mais prósperos estados da nação brasileira, contribuindo para a grandeza desta formosa e privilegiada pátria do continente sul-americano.

Não existem nem jamais existiram antagonismos de origem, entrechoques de interesses econômicos ou rivalidades justificadas entre os filhos da região Norte, Centro e Sul do Estado. Elas se integram e se completam, pela unidade de seus ideais, pelos seus comuns anseios de progresso, pelo sadios espírito de confraternização, que estão a exigir, cada vez mais, a unidade, a integridade e a intangibilidade do território matogrossense.

Unidade federada, com 1.500.000 quilômetros quadrados, para somente 400.000 habitantes, disseminados nas suas várias regiões, este reduzido número de matogrossenses e brasileiros, herdeiros da audácia e da coragem dos antigos bandeirantes, continua a desbravar sertões, a pontilhá-los de cidades, vilas e povoados, a criar indústrias, agricultura, comércio e a fazer crescente conquista no campo das profissões liberais, mantendo sempre aceso o lábaro do mais sadio e elevado patriotismo.

Não procede a disparidade alegada da contribuição para o erário estadual pelas populações do Norte e Sul do Estado, porque a ciência sociológica e política condena este critério, para manutenção ou desagregação de estados e países, pois a criar-se este precedente, a separação de Mato Grosso,hoje, justificaria, amanhã, o absurdo de se dividir o nosso grandioso Brasil, pela verificação, já não contestada, de que os estados do Sul (São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul contribuem com 2/3 das rendas da União! Princípio que nenhum brasileiro digno desse título aceitaria!

Por estes e outros motivos, cada qual mais justifica, e que não escapam ao conhecimento de Vs. Excias., auscultada a opinião pública unânime deste histórico e vasto município, como a elite da sua sede, podemos assegurar a Vs. Excias., o completo repúdio a tão nefasta tentativa, afirmando mesmo que não nos arreceamos de um "plebiscito" pelo qual se afira a vontade do povo matogrossense.

Tanto mais impatriótica e inoportuna é a campanha separatista, quando o país, combalido por duas fundas comoções políticas, que o fizeram estremecer nos seus alicerces, marcha, atendendo aos justos anseios do povo brasileiro, para o retorno ao regime constitucional e para cujo desideratum se impõe um ambiente de paz, de confraternização e de conjugação de esforços de todos os bons patriotas.

O eminente chefe do governo provisório, consciente das suas enormes responsabilidades, honrando o momento histórico que vivemos, num gesto largo e nobre de patriotismo, devolveu o grande Estado de São Paulo à posse de si mesmo, vem aproveitando os verdadeiros valores, onde quer que estes se encontrem, sem estreito partidarismo, política sábia e construtiva que sem sendo seguida com elevação e firmeza pelo ilustre sr. Interventor federal neste Estado, atitudes e orientação que criaram o ambiente de tranquilidade nacional, no qual se vem processando os trabalhos da memorável 3a. constituinte do Brasil independente e 2a. do Brasil República.

Nós, matogrossenses, de nascimento ou de coração, devemos nos colocar à altura dessas atitudes e dessa elevação, estabelecer em nossas fronteiras a concórdia geral, esquecer ressentimentos, irmanarmo-nos todos num só anseio, numa só aspiração - a devolução do país ao regime legal, renovado, pela implantação de novas diretrizes, mais consentâneas com as nossas aspirações, com o ambiente brasileiro, com o nosso grau de cultura, com as conquistas liberais, dignas da civilização hodierna.

Queriam pois Vs. Excias. receber a manifestação da nossa solidariedade, pela união e integridade do nosso Estado e levá-la ao conhecimento do governo provisório e da augusta Assembleia Constituinte, como do país.

Com a segurança da nossa estima, saudamos a Vs. Excias., cordialmente.

Waldemir Neves, juiz de direito; Jorge Bodstein Filho, coletor estadual; Francisco Faustino Dias, prefeito; João Filgueiras, 2° tabelião; Arsênio Moura, escrivão da coletoria estadual; Gustavo Rodrigues da Silva, fazendeiro; Melanias Leal, 1° juiz de paz; Ubaldino Correa da Costa, negociante; Joaquim Evaristo de Queiroz, funcionário público; Antonio Garcia de Freitas, promotor de justiça; Leozoro Rodrigues de Almeida, fazendeiro, João Cassiano do Nascimento, proprietário; João Dantas Filgueiras, secretário da prefeitura; Vicente Faustino Franco, delegado de polícia; Eponino Garcia Leal M. do C. consultivo; João Valim, professor; Osvaldo Brandão, distribuidor do foro, Edu Neves, farmacêutico; Nahim Agy, comerciante, José Pereira dos Santos, carpinteiro, Olavo Filgueiras, funcionário municipal; João Inocente do Nascimento, barbeiro; Antonio Neves do Nascimento, tabelião do 1° ofício; João Ferreira Leal, escrivão do distrito; Emílio Martins Ferraz, proprietário; Ovídio Alves Pereira, fazendeiro; Salomão João, comerciante; José Severino da Cunha, funcionário municipal; João Luiz da Silva Santos, fazendeiro; Joaquim Lucas de Oliveira, fazendeiro; Cid do Espírito Santo, 2° tenente; e Manoel Gomes Otero, negociante.


FONTEJornal do Comercio (Campo Grande), 10 de março de 1934.

FOTO: reprodução do livro Santana do Paranaíba, de Hildebrando Campstrini (2002)

OBISPO MAIS FAMOSO DE MATO GROSSO

  22 de janeiro 1918 – Dom Aquino assume o governo do Estado Consequência de amplo acordo entre situação e oposição, depois da Caetanada, qu...